Translate

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Instinto

Crédito Foto: Felipe Cardoso

A Natureza reivindica sua Lei.
O corpo sente.
Meu ventre se contrai revolvendo o vazio, 
sem poder reter devolvo 
à terra o que a ela pertence.
A semente não germinada seca.
Mas, não está morta.
A cada mover de céus e terras, sinto 
a fonte de vida se esvair.
Temo que o tempo devaste 
minhas raízes e choro 
pelo sangue derramado.

(Millena Cardoso de Brito)

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Carne da minha carne


Não é que eu goste de sacanagem
é que eu gosto de amar com o corpo também.
Gozar a ternura de ter tua carne na minha
e sentir escorrer o desejo de completar em mim
a obra inacabada.

(Millena Cardoso de Brito)

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Encontro


Eu tentei adiar este dia o mais que eu pude. Fugir do incômodo de sentir o sol arder em meus olhos ao acordar de uma noite de sono tranquila.

A noite muitas vezes esconde o que deveríamos saber, mas há quem prefira as sombras à luz. Somos sombras e luz.

Foge aos nossos olhos a verdade e isso muitas vezes nos faz escurecer. Às vezes, escolhemos nos ocultar nas sombras para não nos desgastarmos ao sol ou talvez por medo de sermos consumidos por algo que supera o nosso entendimento. Mas, há os que escolham as sombras e não posso responder por eles.

Trituro no peito as minhas muitas faces e apesar de buscarem ser uma, não sei como sintetizar os elementos que me compõe. Fogo, água, terra, ar, nenhum deles me resume. Sofro de encantamento crônico. Tudo é de causar admiração e tudo deve ser bom, se não for, tem que ser. Teimosia de pensar que há espaço para coisas que não podem ocupar o mesmo espaço. As leis da física me irritam, gostaria de mudá-las, mas esse pensamento é infantil, assim como, é a forma como desejaria que o mundo fosse.

Fugi da realidade, talvez, por ela ser diferente do mundo que eu construí. Eu deixei que a vida passasse lá fora. Os meus amigos de infância eu deixei brincarem sem mim, mesmo quando eu podia estar com eles; eu deixei meus aspirantes a namorados de adolescência, encontrarem outras garotas;  pois eu não queria saber o que era viver. Eu sentia como se a vida não fosse para mim. Eu me suicidei todos os dias. Tomei o veneno, sem sentir o gosto da morte, um veneno fraco que só estava me matando aos poucos, pois eu sentia um prazer masoquista de me fazer sofrer como se eu merecesse isso.

Esses foram meus dias de sombra. Eu me escondi da vida, como se ela fosse uma doença contagiosa. Uma doença sem cura que eu precisava aprender a conviver.

Mas, enfim, fui apresentada a vida por meio de passos de dança. Letras, sons, giros, movimentos tomaram conta do meu corpo e foram me levando ao seu encontro. A vida se fez necessária, se impôs com força aos meus sentidos despertos.

A vida me tirou para dançar e nós vamos girando pelo tempo até o fim da nossa canção.


Como posso parar de girar se a minha música não acabou?

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Resgate

Não quero desejar nada. Os desejos tiram a paz. Cansei de querer. Vou adestrar corpo e mente. Colocar freios em meus pensamentos. Eles são rebeldes, cavalos selvagens querendo romper o tempo, mas é preciso domesticá-los.  Deixei-os soltos e eis que eles regressaram para me estraçalhar. Eles são minha fonte de prazer e dor. Não consigo fugir dos seus apelos e deixá-los morrerem dentro de mim. Preciso deixá-los fluir.

Não quero desejar nada. Mas, isso já é um desejo. Quero cobrir o tempo que gostaria de esquecer e nunca mais ter de voltar a vê-lo. E isso é um desejo. Tento fugir desse tempo, mas ele sempre dá um jeito de me visitar com um álbum com fotografias que você nunca gostaria de ter tirado. O tempo é meu amigo, mas ele cobra pelos meus erros. Estou pronta para assumi-los, mas não é fácil. Por que sempre tem alguém para dizer que erros são imperdoáveis. Para essas pessoas, eu pergunto: o que eu faço com tudo o que aprendi com eles? Lição aprendida, lição aceita. Aceitem.

O que eu posso desejar? Se o que eu quero sempre está bem distante do que é considerado real.

E o que é real? O que me toca, talvez. Mas, o que não me toca? Senhora tempestade que sente das mais variadas formas e com uma intensidade massacrante. Trituro os dias no peito e ele costuma sangrar por dores que nem são as minhas. Minhas várias faces brigam entre si e se digladiam para tomar um espaço maior no meu ser. Mas, o que sou? Parece que só existem perguntas difíceis de serem respondidas.


O que sei é que preciso escrever, dançar, brincar e regressar ao seio da Criação para que eu possa me resgatar.

(Millena Cardoso de Brito. 09/09/2016)